Tuesday, July 22, 2008

Take the box


Olho para as fotografias e não te reconheço. É como se nunca tivesses existido. Como não existiu o teu carro à porta do meu prédio, não existiu aquela praia escondida na serra, não existiram as manhãs de lençóis revoltos, nem as tuas mãos, nem intermináveis conversas ao telefone, noite dentro, nem os teus cabelos, nem a minha pele. Olho para as fotografias e sinto que podia rasgá-las sem um estremecimento. São papéis lustrosos, de sorrisos. Vazios.
Lembro tudo como se tivesse sido um sonho. Junto as fotografias à caixa onde estão as cartas que também não existiram. E os fantasmas de tudo o que me deste. Cheguei a querer entregar-ta. Cheguei a querer ver tudo espalhado na tua rua, o sangue de um espetáculo de morbidez, os vizinhos à janela. Talvez para tentar re-presentar tudo. Já não preciso. Os fantasmas já não me assustam. Como nunca te assustaram a ti. Não existo.

1 comment:

M said...

Há dias fiz exactamente o mesmo: vi velhas fotografias, albuns inteiros, os livros com as dedicatórias, o poemário...

A indiferença é cruel, e o tempo faz mesmo milagres. De Tudo passa a Nada, de razão de viver para fantasma do passado.

Mas eu sinto que aquilo aconteceu, uam sensação distante como um dejá vu: só não foi nem comigo nem com ele, foi com espectros, numa outra vida, de tão distante.