Wednesday, December 26, 2007


"O mar é um orgão que nos falta."



Frank Green, in Diaporese
:)

Wednesday, December 19, 2007

Natal, e não Dezembro

Entremos, apressados, friorentos,
Numa gruta, no bojo de um navio,
Num presépio, num prédio, num presídio,
No prédio que amanhã for demolido...
Entremos, inseguros, mas entremos.
Entremos e depressa, em qualquer sítio,
Porque esta noite chama-se Dezembro,
Porque sofremos, porque temos frio.

Entremos, dois a dois: somos duzentos,
Duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
A cave, a gruta, o sulco de uma nave...
Entremos, despojados, mas entremos.
De mãos dadas talvez o fogo nasça,
Talvez seja Natal e não Dezembro,
Talvez universal a consoada.

David Mourão-Ferreira

Saturday, December 15, 2007

Sigur Rós

Vem aí o Natal.

Já saiu "Heima", o novo dvd dos Sigur Rós.

Conseguem pereceber a ligação?... :)

Monday, December 10, 2007

Dia Internacional dos Direitos Humanos




Há algum tempo atrás, a comunidade internacional cerrou os punhos perante o Holocausto e jurou "Nunca mais". Hoje, dia 10 de Dezembro de 2007, a mesma comunidade cerra os olhos e finge não ver o que se passa no Darfur, da mesma maneira que não quis ver o que se passou no Ruanda.


Onde está a memória?


Onde está a promessa?


Onde está a responsabilidade?




Friday, December 7, 2007


Ninguém quebra o silêncio da minha vida por decidir. O telemóvel não toca. Apetece-me atirar o silêncio contra a parede, para o ver escaqueirado. A areia fina escorre inexorável entre os dedos, tal como me avisaste, amigo distante. E eu limito-me a olhar o tempo sem poder detê-lo: não tenho dedos, não tenho mãos. Ainda terei rosto?

Tenho o cérebro desfeito como aquele cadáver amortalhado nos cobertores em que morreu, um tiro no palato, um hematoma da força da coronha sobre o ventre, o crânio em pedaços. Está morto e perdeu o rosto, como todos os mortos.

Terei perdido o meu? Fui procurá-lo ao Parque e encontrei-o, breves pedaços vegetais rasando o chão. Os troncos ondulantes dos plátanos. Os pedaços do meu rosto _ crac!!_ sob os meus pés.

Thursday, December 6, 2007

Ó sáchavôr!!!

Queria um gato e um corte de cabelo...

Tuesday, December 4, 2007

?

What is a god of phoney creation,

Where am I going with no destination,

What if the fish came from the sea,

What if my lover made me feel free,

What if my intake caused revelation,

What if the point was reincarnation,

What if my shoes do'nt match my jacket,

If it's not working why don't you smack it,

What if your mamma said you were fat,

If you are lost find where your at,

What is a number without any time,

You can't get higher with nothing to climb,

Why have a body if you ain't got a mind,

What is a searcher with nothing to find,

Why is the traffic refusing to stop,

Why climb the ladder if you can't reach the top,

Where is the what if the what is in why,

Where is the what if the what is in why

Where is the what if the what is in why,

What do you dream of when you sleep at night,

Wee how the blind man fills up with light,

What is a bird with nowhere to fly,

How can you leave and not say goodbye,

What is a hunter with nothing to find,

What is the goodness without the unkind,

When did the outfit fall out of fashion,

When did the lover run out of passion,

My reincarnation time a phoney creation rhyme,

With no destination mine my information's fine,

Why did the voice say don't step on the floor,

Why did the sign say so float through the door,

How did the loser get to be rich,

What is a saleman with nothing to pitch,

When did the fool het to be king,

Why did you leave when they asked you to sing,

Why loose belief if you got a dream,

What is a train that ran out of steam,

what is a spy with no-one to spy,

On who do you sleep with nothing to lie on,

What if the fruit don't fall from the tree,

What if these questions just won't let you be,

Why waste your time looking for proof,

What if the answer is never the truth.

Sunday, December 2, 2007

A propósito de um post de José Mário Silva

Descobri ontem o blog "letra minúscula" de José Mário Silva e, depois de algumas horas de fascínio a desfolhar os arquivos, deparo-me com uma das regras da "geometria afectiva":


"Os triângulos amorosos nunca são equiláteros"


Imediatamente recordei o teorema de Vergílio Ferreira segundo o qual


"No amor nunca os pratos da balança estão equilibrados. E como a essência do amor é etérea, quem pesa mais é quem ama menos."


Como é que alguém pode dizer que o amor não é uma ciência exacta?

Informação altamente fidedigna!!

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Parece-me óbvia a certeza dos resultados deste teste: os pouquíssimos génios (cerca de 5) existentes no mundo lêem este blog. Grata pela vossa preferência.

Tuesday, November 27, 2007

A outra margem

Passaram semanas desde que fui ver este filme de Luis Filipe Rocha, mas continuo a dar comigo fascinada: não é só a excelente banda sonora, as excelentes interpretações, as paisagens, a pureza dos diálogos. É o facto de "A outra margem" ser um filme sobre a igualdade que não cai em dramatismos, em pessimismos ou em compaixão. É uma simples história de amizade e de coragem, que me deixou a sonhar com o dia em que um filme como este não será considerado "controverso"... O dia em que simplesmente não tenha que haver pontes, porque todos estamos na mesma margem.

Monday, November 19, 2007

A gente vai continuar

Tira a mão do queixo não penses mais nisso
O que lá vai já deu o que tinha a dar
Quem ganhou ganhou e usou-se disso
Quem perdeu há-de ter mais cartas pra dar
E enquanto alguns fazem figura
Outros sucumbem á batota
Chega a onde tu quiseres
Mas goza bem a tua rota

Enquanto houver estrada pra andar
A gente vai continuar
Enquanto houver estrada pra andar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar
Enquanto houver ventos e mar

Todos nós pagamos por tudo o que usamos
O sistema é antigo e não poupa ninguém
Somos todos escravos do que precisamos
Reduz as necessidades se queres passar bem
Que a dependência é uma besta
Que dá cabo do desejo
A liberdade é uma maluca
Que sabe quanto vale um beijo


Jorge Palma

Sunday, November 11, 2007

Desencontro


Desirmandade, irmãos!


Margens do mesmo rio,


Mas sem ponte.


É como se a unidade


Dum bifronte


Se perdesse,


E a mais sedenta face


Recusasse


Beber na mesma fonte


Onde a outra bebesse.




Sois a noite da vida, e eu sou a madrugada.


Onde começa a luz, começa a dimensão


Da minha humanidade.


Vejo o sol, mostro o sol a quem é cego,


E nego


Que o tenebroso seja a claridade.




Podeis o que não posso:


Entender como lobos


A parábola dos vimes...


Mas é vosso


Também


O pesadelo


Dos crimes.


Meu, é o destino de vos acordar


A cantar.






Miguel Torga

Saturday, November 3, 2007

Autumn Leaves


The falling leaves drift by the window

The autumn leaves of red and gold

I see your lips, the summer kisses

The sun-burned hands I used to hold



Since you went away the days grow long

And soon I'll hear old winters song

But I miss you most of all my darling

When autumn leaves start to fall





Lyrics by Johnny Mercer, Music by Joseph Kosma

Tuesday, October 23, 2007

SOBRE O CAMINHO

Nada.

Nem o branco fogo do trigo
nem as agulhas cravadas na pupila dos pássaros
te dirão a palavra.

Não interrogues não perguntes
entre a razão e a turbulência da neve
não há diferença.

Não colecciones dejectos o teu destino és tu.

Despe-te
não há outro caminho.


Eugénio de Andrade

Wednesday, October 17, 2007

Apetecia-me subir ao último andar, mergulhar do telhado, esmagar-me no betão, desamparada, desfigurada, desmembrada, desfeita, desconstruída. Só para voltar a sentir o mesmo que sentia quando caía na vertigem de ti e me desamparavas desfiguravas desmembravas desfazias desconstruías. E eu morria e renascia purificada. Alguma vez fui capaz de te desconstruir?

Tuesday, October 16, 2007

Afinal, de que matéria somos feitos?
Levamos uma vida a pensar que somos uma orgulhosa torre de racionalidade, de princípios, de valores, do ferro forjado da moral.
Mas quando a coisa é a doer e somos realmente postos à prova descobrimos que não somos mais do que este monte de nervos e ossos e entranhas.
Reles esterco (des)humano.

Tuesday, October 2, 2007

" Lembro-me sobretudo de uma rapariga de 20 anos que usava uma cabeleira postiça. Percebia-se logo que a cabeleira era postiça, mas ela usava-a com tanta dignidade que era como se fosse uma coroa. Uma coroa de rainha."
António Lobo Antunes, em entrevista à Visão nº 760

Friday, September 28, 2007

Reinvenção



Os poucos que tiveram a sorte de assistir ao espetáculo do projecto "Canto Coimbra" e de Cristina Branco na noite de 27 de Setembro, ficaram por certo tão encantados como eu.

Cristina Branco e a sua formação conseguiram, mais do que uma homenagem, uma reinvenção da alma da música de Zeca Afonso: embora fiéis à sua raíz, souberam dar-lhe um cheiro de novidade e da essência livre do jazz (como o próprio Zeca teria gostado), numa voz fresca e doce como Maio.

No entanto, foi o projecto "Canto Coimbra" que mais me surpreendeu e que mais me agradou. Pela forma sublime como interpretaram a canção de Coimbra, recordando não apenas José Afonso,mas grandes mestres como Carlos Paredes e Luis Goes. A guitarra portuguesa em perfeito abraço com o piano e o acordeão, numa viagem alada sobre os telhados labirínticos da baixa, as vielas, as janelas, as calçadas e o azul-verde deste Mondego que nos inunda.

O disco de Cristina Branco, "Abril", sairá dentro de um mês. E é obrigatório para todos os que gostam de José Afonso.

E os "Canto Coimbra"? Existirá um álbum? Se ainda não existe, aguardo-o mais que avidamente.

Thursday, September 27, 2007

giving up


Love ridden, I've looked at you

With the focus I gave to my birthday candles

I've wished on the lidded blue flames

Under your brow

And baby, I wished for you

Nobody sees when you are lying in your bed

And I wanna crawl in with you

But I cry instead

I want your warm,

But it will only make me colder when it's over,

So I can't tonight, baby

No, not "baby" anymore - if I need you

I'll just use your simple name

Only kisses on the cheek from now on

And in a little while, we'll only have to wave

My hand won't hold you down no more

The path is clear to follow through

I stood too long in the way of the door

And now I'm giving up on you
Fiona Apple

Friday, August 31, 2007

Amor ou Consequência


O amor é um desafio constante. O único jogo em que o troféu só faz sentido quando partilhado com o adversário. Um duelo vencido apenas por quem tem a coragem de o aceitar.


Cap pas cap?

Thursday, August 23, 2007

"Lucha de gigantes
convierte,
el aire en gas natural
un duelo salvaje
advierte,
lo cerca que ando de entrar
En un mundo descomunal
siento mi fragilidad.

Vaya pesadilla
corriendo,
con una bestia detras
dime que es mentira todo,
un sueno tonto y no mas
Me da miedo la enormidad
donde nadie oye mi voz.

Deja de enganar
no quieras ocultar
que has pasado sin tropezar
monstruo de papel
no se contra quien voy
o es que acaso hay alguien mas aqui?

Creo en los fantasmas terribles
de algun extrano lugar
y en mis tonterias
para hacer tu risa estallar

En un mundo descomunal
siento tu fragilidad.

Deja de enganar
no quieras ocultar
que has pasado sin tropezar
monstruo de papel
no se contra quien voy
o es que acaso hay alguien mas aqui?

Deja que pasemos sin miedo."

Thursday, August 16, 2007

pesadelo kafkiano


They haven’t departed.
They haven’t gone home.
The trials haven’t started.
No evidence shown.
They don’t get no visits.
They don’t get no calls,
and nobody tells them nothing at all.

The headphones and the blindfolds,
the days and the weeks.
The overalls of orange, the manacled feet.
A Kafka-esque nightmare.
A legal black hole.
A corner of Cuba
named Guantanamo.

The warmongers tell us
they gave up their rights
when they attacked us
and our way of life.
Oh but our way of life
depends on the law.
On liberty and freedom
and justice for all.

Well they talk about justice in the US of A.
It’s the land of the free and the home of the brave.
Yea, but outside of America anything goes.
From Bagram to Abu Ghraib
to Guantanamo.

In 70's Ulster the government thought
if they locked up the suspects
the terror would stop.
But all that internment actually did
was provide the Provos
with more angry kids.

Oh but sometimes I wonder if our leaders really care?
They rely on these demons to keep people scared.
And unwilling to question the fate of those poor souls who lie
rotting in the cages of Guantanamo

They run for it down the road,
With an arm around her waist,
He leads her to a place,
He knows...


The divine comedy

Aniversário

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui --- ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça,
com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado---,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa, No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...


Álvaro de Campos

Thursday, August 9, 2007

...





latitude 12º 29' 08.4" S
longitude 13º 35' 06.1" E

Monday, August 6, 2007

partir

Entregar tudo à aventura incerta que se me estende. Um barco faz-se ao mar na escuridão de uma invernia.
Onde a âncora que devia prender-me ao abrigo de um porto qualquer?
O medo de ir, a repugnância de ficar. Um sonho a acenar-me da lonjura de uma infância e a mão da sensatez no ombro.
Seria tão mais fácil a ditadura de um destino ou a intervenção de um deus... Em vez de pagar com lágrimas a exorbitância da Liberdade.

Tuesday, July 31, 2007

não pensar...

...ser como Alberto Caeiro: viver com a inocência e a nitidez de quem sabe que o mundo não é para ser pensado. recusar a filosofia e ter apenas como pensamentos a pureza das sensações... porque "pensar é estar doente dos olhos".

Saturday, July 28, 2007

Cold and broken...

Well I heard there was a secret chord
That David played, and it pleased the Lord
But you don't really care for music, do ya?
Well it goes like this
The fourth, the fifth
The minor fall and the major lift
The baffled king composing Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah

Well Your faith was strong but you needed proof
You saw her bathing on the roof
Her beauty and the moonlight overthrew you
she tied you to her kitchen chair
She broke your throne and she cut your hair
And from your lips she drew the Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah

Well baby I've been here before
I’ve seen this room and I've walked this floor
I used to live alone before I knew ya
I've seen your flag on the marble arch
Love is not a victory march
It's a cold and it's a broken Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah

Well there was a time when you let me know
What's really going on below
But now you never show that to me do you?
And remember when I moved in you?
And the holy dove was moving too
And every breath we drew was Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah

Well maybe there's a God above
But all I've ever learned from love
Was how to shoot somebody who'd out drew ya
And it's not a cry that you hear at night
It's not somebody who's seen the light
It's a cold and it's a broken Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah


Jeff Buckley

Wednesday, July 18, 2007

Será?...

Será que ainda me resta tempo contigo,
ou já te levam balas de um qualquer inimigo?
Será que soube dar-te tudo o que querias,
ou deixei-me morrer lento, no lento morrer dos dias?
Será que fiz tudo que podia fazer,
ou fui mais um cobarde, não quis ver sofrer?
Será que lá longe ainda o céu é azul,
ou já o negro cinzento confunde Norte com Sul?
Será que a tua pele ainda é macia,
ou é a mão que me treme, sem ardor nem magia?
Será que ainda te posso valer,
ou já a noite descobre a dor que encobre o prazer?
Será que é de febre este fogo,
este grito cruel que da lebre faz lobo?
Será que amanhã ainda existe para ti,
ou ao ver-te nos olhos te beijei e morri?
Será que lá fora os carros passam ainda,
ou as estrelas caíram e qualquer sorte é bem-vinda?
Será que a cidade ainda está como dantes
ou cantam fantasmas e bailam gigantes?
Será que o sol se põe do lado do mar,
ou a luz que me agarra é sombra de luar?
Será que as casas cantam e as pedras do chão,
ou calou-se a montanha, rendeu-se o vulcão?
Será que sabes que hoje é Domingo,
ou os dias não passam, são anjos caindo?
Será que me consegues ouvir
ou é tempo que pedes quando tentas sorrir?
Será que sabes que te trago na voz,
que o teu mundo é o meu mundo e foi feito por nós?
Será que te lembras da cor do olhar
quando juntos a noite não quer acabar?
Será que sentes esta mão que te agarra
que te prende com a força do mar contra a barra?
Será que consegues ouvir-me dizer
que te amo tanto quanto noutro dia qualquer?
Eu sei que tu estarás sempre por mim
Não há noite sem dia, nem dia sem fim.
Eu sei que me queres, e me amas também
me desejas agora como nunca ninguém.
Não partas então, não me deixes sozinho
Vou beijar o teu chão e chorar o caminho.
Será,
Será,
Será?


Pedro Abrunhosa

Saturday, July 14, 2007

Cântico de Amor

Ama quem amas, como o vento
Ama as folhas do olmo
(Amor que lhes transmite movimento
E alegria).
Asa que possa andar no firmamento,
Só caminha no chão por cobardia.

Miguel Torga



Friday, July 13, 2007

Da Condição Humana

"Todos sofremos.
O mesmo ferro oculto
Nos rasga e nos estilhaça a carne exposta.
O mesmo sal nos queima os olhos vivos.
Em todos dorme
A humanidade que nos foi imposta.
Onde nos encontramos, divergimos.
É por sermos iguais que nos esquecemos
Que foi do mesmo sangue,
Que foi do mesmo ventre que surgimos."


Ary dos Santos

Fascina-me esta pluralidade, esta miscelânea em que a cidade se vai transformando... Neste lugar de partidas e chegadas é mais evidente essa diferença que nos iguala.
É ao mesmo tempo uma sensação de pertença e de isolamento no meio da multidão. Mas é sobretudo a consciência da insignificância do que sou e a magnitude da minha individualidade quando a vejo assim reflectida.
O fascínio... e o medo de uma espécie de aparição... de mim através dos outros.

Thursday, June 7, 2007

"Music was invented to confirm human loneliness"

Lawrence Durrell

Thursday, May 31, 2007

Saudade


É meia noite. A velha Cabra dá o sinal e soam as primeiras notas das guitarras, com as primeiras lágrimas de quem ouve a sua última serenata. De quem ouve a sua primeira serenata. De quem ouve. Porque este é o momento em que todos somos absorvidos, por antecipação, pela evidência do sentimento da saudade.

Sentimos no olhar dos que nos rodeiam o mesmo orgulho que nos invade. Efe-erre-á!! E rendemo-nos sem complexos à sua inevitabilidade.

Afinal, é Coimbra que nos ensina a crescer e que nos embala os sonhos.

Ninguém precisa falar. Não são precisas palavras perante a surdez da própria chuva, silenciada no negro luto das capas.

Wednesday, May 23, 2007

Às vezes apetece-me odiar-te. Não querer ver-te, fugir de todos os sítios onde te posso encontrar, não suportar a tua voz nem a recordação do teu cheiro agarrada à minha pele.
Mas não cheguei a atravessar essa ponte que em segundos nos transporta do amor ao ódio. Por isso continuo consumida pela saudade, pelo ciúme, pela espera.
Acordo todos os dias para a tua ausência como quem acorda eternamente para a noite-noite.
E a luz que não chega...
Queria que voltasses, desconstruísses o meu corpo, refizesses o meu coração. E a luz que não chega...
Quando é que vais perceber que o que procuras não existe? Que no fim de todas as perguntas está uma pergunta, um vazio? Que a única certeza que existe é a incerteza? E a luz que não chega...
Esquece... Vê se existes sem pensar muito nesse existir. Ou vais acabar por morrer de cansaço, muito antes de a luz chegar.

Friday, April 6, 2007

"Hurt"



I hurt myself today

To see if I still feel

I focus on the pain

The only thing that's real



The needle tears a hole

The old familiar sting

Try to kill it all away

But I remember everything



What have I become

My sweetest friend

Everyone I know goes away

In the end

And you could have it all

My empire of dirt

I will let you down

I will make you hurt



I wear this crown of thorns

Upon my liar's chair

Full of broken thoughts

I cannot repair



Beneath the stains of time

The feelings disappear

You are someone else

I am still right here



What have I become

My sweetest friend

Everyone I know goes away

In the end

And you could have it all

My empire of dirt

I will let you down I

will make you hurt



If I could start again

A million miles away

I would keep myself

I would find a way





Johnny Cash

Sunday, March 11, 2007

Na mesa do Santo Ofício

Tu lhes dirás, meu amor, que nós não existimos.
Que nascemos da noite, das árvores, das nuvens.
Que viemos, amámos, pecámos e partimos
Como a água das chuvas.

Tu lhes dirás, meu amor, que ambos nos sorrimos
Do que dizem e pensam
E que a nossa aventura,
É no vento que passa que a ouvimos,
É no nosso silêncio que perdura.

Tu lhes dirás, meu amor, que nós não falaremos
E que enterrámos vivo o fogo que nos queima.
Tu lhes dirás, meu amor, se for preciso,
Que nos espreguiçaremos na fogueira.

Ary dos Santos

Wednesday, January 10, 2007

Carta de Amor

Entraste na minha vida. Era Natal e eu sofria de uma insónia incurável.
Encheste-me as noites de palavras, de memórias futuras, de vozes, de nevoeiro.
Umas vezes, o que tentas dizer-me é incompreensível, outras pareces eco da voz do meu sangue.
Viciei-me em ti, deixei-me levar, apaixono-me mais um pouco a cada encontro.
Já não és um simples amante que me preenche as madrugadas. Estás comigo nas viagens, acompanhas-me no trabalho, estás ao meu lado quando como (quando, por ti, não me esqueço de comer).E eu não consigo largar-te.
No dia em que a paixão esmorecer (o dia em que conseguir decifrar-te) sei que jamais poderá haver volta. Arrumo-te na prateleira das paixões antigas. E ficará apenas a memória estilhaçada das tuas vozes, a assombrar-me outras noites sem sono.


(ao livro "Ontem não te vi em Babilónia", de A. Lobo Antunes)